sábado, junho 26, 2004

os cinco sentidos

Os cinco sentidos
São belas - bem o sei, essas estrelas
Mil cores - divinais têm essas flores;
Mas eu não tenho amor, olho para elas;
Em toda a natureza
Não vejo outra beleza
Senão a ti - a ti!
Divina - ai! sim, será a voz que afina
Saudosa - na ramagem densa, umbrosa.
Será; mas eu do rouxinol que trina
Não oiço a melodia,
Nem sinto outra harmonia
Senão a ti - a ti!
Respira - n'aura que entre as flores gira,
Celeste - incenso de perfume agreste.
Sei... não sinto: minha alma não aspira,
Não percebe, não toma
Senão o doce aroma
Que vem de ti - de ti!
Formosos - são os pomos saborosos,
É um mimo - de néctar o racimo:
E eu tenho fome e sede... sequiosos,
Famintos meus desejos
Estão... mas é de beijos,
E só de ti - de ti!
Macia - deve a relva luzidia
Do leito - se por certo em que me deito;
Mas quem, ao pé de ti, quem poderia
Sentir outras carícias,
Tocar noutras delícias
Senão em ti - em ti!
A ti! ai, a ti só os meus sentidos
Todos num confundidos,
Sentem, ouvem, respiram;
Em ti, por ti deliram.
Em ti a minha sorte,
A minha vida em ti;
E quando venha a morte,
Será morrer por ti.
Almeida Garrett, Folhas Caídas

domingo, junho 20, 2004

nunca te beijei.....

Amo-te tanto!
E nunca te beijei...
E nesse beijo, Amor,
que eu te não dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz!

florbela espanca

quarta-feira, junho 09, 2004

Manhãs brumosas

I there! Posted by Hello


Aquela cujo amor me causa alguma pena
Põe o chapéu ao lado,
abre o cabelo à banda,
E com a forte voz cantada com que ordena
Lembra-me,de manhã,
quando nas praias anda,
Por entre o campo e o mar,
bucólica, morena,
Uma pasteora audaz da religiosa Irlanda.

Que línguas fala?
Ao ouvir-lhe as inflexões inglesas
- Na névoa azul, a caça, as pescas, os rebanhos!
-Sigo-lhe os altos pés por estas asperezas;
E o meu desejo nada em época de banhos.
E, ave de arribação, ele enche de surpresas
Seus olhos de perdiz, redondos e castanhos.
As irlandesas têm soberbos desmazelos!
Ela descobre assim, com lentidões ufanas,
Alta, escorrida, abstracta, os grossos tornozelos;
E como aquelas são marítimas, serranas,
Sugere-me o naufrágio, as músicas, os gelos
E as redes, a manteiga, os queijos, as choupanas.
Parece um rural boy!
Sem brincos nas orelhas,
Traz um vestido claro a comprimir-lhe os flancos,
Botões a tiracolo e aplicações vermelhas;

E à roda, num país de prados e barrancos,
Se as minhas mágoas vão, mansíssimas ovelhas,
Correm os seus desdéns, como vitelos brancos.
E aquela cujo amor me causa alguma pena
Põe o chapéu ao lado, abre o cabelo à banda,
E com a forte voz cantada com que ordena,
Lembra-me, de manhã, quando nas praias anda,
Por entre o campo e o mar, bucólica, morena,
Uma pastora audaz da religiosa Irlanda.

cesário verde
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